domingo, 26 de agosto de 2007

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“Oi! Nunca te vi aqui... Você vem sempre?”. Leandro sabe que aquele bofe nunca pisou ali antes. “Não. É a primeira vez...”, respondeu Oscar. Oscar é o tipo de cara que num lugar GLS atrai todos os olhares. “Aceita?”, Leandro oferece o copo, suado com várias pedras de gelo dentro que se dissolvem em meio a um líquido azul. “O que é isso?”. Como se admirasse a bebida azul, Leandro ergue o copo diante dos olhos e como num passe de mágica as luzes da pista fazem que raios azulados partam do copo em direção a face dos admiradores. “É vodka com enérgico. Gosto da cor.” “Legal. Achei que gostasse de beber... Obrigado. Eu não bebo nada muito forte.” Diz Oscar pronto para deixar aquela figurinha que exala ares de estou me oferecendo para você, quer? “Não é forte. O energético quebra bem a vodka.” Leandro tenta convencer, sabe que um bofe algumas doses acima da chata sobriedade dos normais é muito mais interessante. E muito mais fácil de ser convencido a fazer coisas... “Ainda assim, não. Obrigado.” “Qual o seu nome?” Leandro percebe que o bofe está para escapar. “Oscar. E o seu?” Oscar pergunta mais por impulsividade do que por quer saber. É indiferente para ele saber o nome daquela criaturinha estranha. “Leandro. Muito prazer, Oscar.” “Muito prazer, Leandro.”

Antes que tivesse tempo de dizer qualquer coisa, algo que o livrasse daquela companhia, foi puxado por um Leandro que convida: “Vem, vamos dançar, adoro essa música.” Levado por pernas que pareciam não obedecer ao comando da sua vontade, Oscar seguiu Leandro. Os dois dançam. Os olhos de Oscar tentam se desviar dos olhos insistentes olhares libidinosos de Leandro. Olhares que percorriam todo o seu corpo, em especial um pouco abaixo da cintura e dali procuravam seus olhos como que convidando par algo. Leandro sorri. Um sorriso carregado de segundas intenções. O corpo de Oscar é bem trabalhando em academia. Ele puxa muito ferro para valer e treina jiu-jitsu. Sua vida se resume em treinar, treinar, treinar.

“Vem, vamos para o bar, é mais ‘sussi’ para gente conversar.” Leandro convida e arrasta pelo braço um Oscar constrangido. Sentam numa mesa de canto. Leandro inclina-se sobre a mesa e olha nos olhos de Oscar. “Você não bebe mesmo?” Como se fosse inacreditável encontrar alguém que não bebe álcool. “Vou pegar uma água.” “Toma bomba?” “Não. É academia mesmo. São muitos anos treinando pesado...” “Puxando ferro...” Conclui Leandro enquanto sorve do seu líquido azul.

Oscar levanta-se e vai até o bar, em seguida volta com a água. Percebe que Leandro acompanha cada passo seu enquanto volta à mesa. Sente-se um pouco desconfortável com a forma como Leandro o olha. Exageradamente objetivo em suas intenções.

“Você está se descobrindo, não é?” Leandro tem certeza que Oscar é um desses bofes que sempre sentiu tesão por homem, mas nunca teve coragem de assumir isso nem para si mesmo. De repente um dia cria coragem e quer experimentar para saber como é. “É... Digamos que sou pouco experiente... Totalmente inexperiente. Sei lá. As coisas são confusas. Saca?” “Entendo. Sabe... No fundo somos todos muito parecidos. Fazemos apenas opções diferentes, uns preferem ser A e outros P, uns mantém a casca de macho, como você, e outros ficam mais alegres, como eu... Veja, por exemplo, naquela mesa ali, quatro bichas. Uma metida a intelectual sempre com aquele ar blasé na cara. O outro é um estilista pseudo-famoso que acha que pode tudo. O de camisa branca é um jornalista metido a crítico que escreve num caderno de cultura de um jornal qualquer, é o mais filha-da-puta do grupo. E o cara de regata com pinta de macho é um garoto de programa que sai com todo mundo, anda saindo com certa exclusividade com o estilista, dizem que tem pau de 24 cm, mas por grana vira passivo. Isso é o mundinho, todo mundo sabe de todo mundo. Vai se acostumando.”

Oscar ri. Realmente Leandro é excessivamente alegre para os padrões de suas amizades. Fica imaginando se os caras lá da academia o vissem conversando com um “frutinha”, como eles dizem, iam cair matando. E essa coisa de “mundinho” é um pouco preocupante sim. Sempre soube um pouco disso tudo e foi o medo que sempre o fez passar longe de lugares como este em que está. Foi preciso criar coragem por dias para entrar e estar ali. Ir se acostumando não é fácil.

“Qual sua idade?”, Leandro quer saber. “Tenho 23 e você?” “Sou mais novo, tenho 21.” Leandro não se cansa de olhar para Oscar. Ele tem o corpo mais perfeito que já viu no mundo real, igual aos corpos das revistas e sites de homens nus que gosta de ver. A camiseta muito justa que ele veste parece que não vai conter o tórax de músculos fortes como aço. E os braços? Imagina aqueles braços o envolvendo, quase o sufocando de tanto prazer que podem proporcionar. Sim, aquele cara ali na sua frente pode dar tudo o que sempre sonhou de um homem.

A delicadeza quase feminina de Leandro enigmaticamente começa a encantar Oscar em sua virilidade, traz a tona seu lado que quer possuir e proteger. Por instante tem a sensação que sente desejo em tomar aquele viadinho nos braços. Não consegue ver Leandro de outro jeito. Um viadinho. Certamente ele precisa de proteção. Com aquele jeitinho esfuziante deve ser o tipo que sofre com preconceitos. Fica imaginando o quanto já foi chamado de – viadinho, bichinha, gayzinho...

Por baixo da mesa, Leandro, o atiradinho, acaricia a coxa de Oscar. Sente os músculos delineados como os um deus grego imortalizado no mármore. Sabe que está sendo ousado e que Oscar não deve estar acostumado com esse tipo de coisa, sobretudo, em público, apesar de estarem numa boate GLS. Justo na primeira vez em um ugar daquele e Oscar foi cair logo em suas mãos, diverte-se com a ironia do destino.

“Adoro você metido dentro desse jeans tão justo que marca com perfeição esse seu corpo absurdo.” “Absurdo?” Assusta-se Oscar. “É uma expressão... Um gíria da moda, coisa de gay...” “Ah! Legal... Nunca tinha ouvido. Ninguém tinha me dito que tenho um corpo absurdo, saca?” “E como saco. Saco esse seu corpo. Esse volume entre suas as pernas. O seu saco...” Leandro esta alucinado. “O quê?” Pergunta Oscar sem entender. Leandro ri. O bofe não está acostumado com esse tipo de papo, conclui em seus pensamentos e devaneios.

“Só estou dizendo que você é gostoso. Um bofescândalo. Já ouviu essa?” “Bofe escândalo... Escandaloso? Isso deve ser meio estranho... Pelo que sei o ‘bofe’ na gíria gay é um cara macho, um macho escandaloso fica meio viado...” Leandro não se contém e ri alto. “Não.” Quase toca o queixo de Oscar que parece vindo de outro mundo. E de certa forma, vem mesmo. “Um ‘bofescândalo’, escreve-se tudo junto, é um bofe que causa. Entende?” “Causa?” “Causa... É o cara que impressiona e que causa um impacto. Porque é perfeito. É tudo! Um bofe tudo. Corpo perfeito, estiloso, gostoso...” “Ah, ta! É uma espécie de elogio...” “Exatamente”. Conclui Leandro satisfeito com a primeira que deu ao bofe sobre a dialética do mundinho.

A essa altura a mão de Leandro está entre as pernas de Oscar acariciando o volume. Oscar responde às carícias com uma expressiva ereção.

“Agora levanta e vai até o bar buscar outra água para você.” Sugere Leandro. “Não posso...” Diz um Oscar desconsertado. “Ah, pode sim.” Um sorriso malicioso estampa o rosto de Leandro. “Está louco. Como vou levantar assim...” “Ah...” Leandro faz carinha de criança querendo, fazendo birra. “Mas isso que é legal. A bicharada vai adorar. Vai... Por mim. Quando você me pedir uma coisa, juro que faço. Combinado?”

Tara de bichinha. Com certa irritação que o deixou “mais tesão” na opinião de Leandro, Oscar num só movimento levanta e vai ao bar, coisa de seis ou sete passos apenas. Pede uma água, pega a água e volta. Na volta dele Leandro tem seu êxtase com a visão do bofe excitado, aquele volume exuberante, provocado por suas mãos, mãos hábeis em deixar um macho de pau duro. Leandro faz sua melhor carinha de putinha que quer ser possuída por Oscar que volta olhando-o nos olhos como se quisesse dizer algo, algo do tipo – “estou puto com você por me fazer passar por isso”. Passar por isso significa se sujeitar aos olhares de êxtase de todas as outras bichas tomadas de inveja e que não acreditam na sorte de Leandro, que todos conhecem. Murmuram entre si – “o que aquela vadia fez para conseguir um bofescândalo?” O estilista que paga o michê cujo pau reza a lenda medir 24 cm quase cai da cadeira para melhor medir o bofe que vai ao bar de pau duro. Comenta para o seu grupo – “muito bem dotado”.

“Você me deve uma.” Diz Oscar em tom autoritário, quase uma advertência. Leandro adora ouvir. É o que mais quer ter a oportunidade de pagar tudo que deve a Oscar. “Claro. E tenho certeza que vou adorar pagar essa que devo e muitas outras...” “Você me assusta um pouco.” Oscar senta-se afastado de Leandro, distante o suficiente para ficar livre das mãos perigosas daquela bichinha que está exercendo um estranho fascínio sobre ele.

“Vamos para outro lugar?” Convida Leandro. “Outro lugar?” “É. Outro lugar.” “Onde?” “Que tal o meu apê?” “Você mora sozinho?” “Moro. Sou do interior. Estou aqui fazendo faculdade...” “O que você faz?” “Primeiro ano de arquitetura. Você estuda?” “Fazia Direito, tranquei. Atualmente só treino.” “Treina?” “Lutador. Faço jiu-jitsu.” “Meu Deus! Um lutador... Você é tudo, cara!” Leandro quase tem um orgasmo, um lutador é seu sonho de consumo. “Está de carro?” “Estou.” “Resolvido. Vamos para meu apê!” De alguma forma Leandro convence, saem os dois da boate diante dos olhares de tantos outros que querem estar no seu lugar.