domingo, 26 de agosto de 2007

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“Está feito.” Diz Jean ao telefone a Pablo. “O que está feito?”. “Acabei de te mandar um email com um link. Entre e veja”. “Espera um pouco, estou em frente ao computador... Sim, seu email chegou”. Pablo clica no link, abre uma página do SexTube. Loading... É um vídeo de 3 minutos e 47 segundos. Play. Nico aparece sobre uma cama de quatro pelado apenas com uma corrente prateada no pescoço enquanto um velhote o enraba por trás e diz obscenidades. Ao lado uma mulher impassível assiste a cena. O gigantesco pau de Nico pende molengo, aquilo não causa nenhum tesão. Está claro que ele está dando a bunda exclusivamente por grana. “Meu Deus!”. Pablo ainda está com Jean na linha. “Você ficou louco. Sabe quem é o coroa nesse festim licencioso?”. Pergunta não acreditando no que vê. “Sei. Sim”. Pablo assiste ainda os instantes finais do vídeo, a cena é a mesma, durante o tempo todo Nico permanece de quatro com a bunda virada para o coroa que fode o michê. O problema é que o coroa barrigudo e sua mulher são pessoas importantes e muito conhecidas na sociedade, ele é um empresário poderoso e influente também no meio político. “Como você conseguiu essa bomba?”. “Lembra que te falei que tinha como conseguir? Foi beijando na boca, fazendo meia-nove e troca-troca com um sujeitinho asqueroso que me deu o vídeo em troca de sexo”. Pablo deu play outra vez para assistir novamente. O vídeo é incrível, a câmera está instalada num ângulo que além de pegar todos os movimentos dá o rosto dos três, é impossível dizer que eles não são eles e que não está rolando o que está rolando. “Quem é esse cara que te passou essa merda?”. “É o viado nojento que vivia dando em cima de mim, ele é assessor do coroa...”. “Isso vai dar merda. Você postou isso agora?”. “Há pouco, mas disparei emails com o link para todo mundo e como o vídeo não é pesado, mandei no email de um tanto de gente...”. “Cara, você vai se ferrar...”. “Queria ver a cara do Lélio”. “Você mandou para ele também?”. “Sim. Mandei o link e o vídeo em anexo”. Pablo desliga sem dizer mais nada. Sente forte cheiro de merda no ar se espalhando por todos os lados.

Nico chega ao apartamento de Lélio. Ele ligou pedindo que viesse urgente. Lélio está estranho. Nico tenta dar um beijo, mas Lélio vira o rosto sério. “Vem cá”. Passam da sala para o que Lélio chama de estúdio, um ambiente amplo com um monte de coisas que lembram um local de trabalho de um estilista, num dos cantos na mesa um notebook ligado, Lélio indica a cadeira para Nico sentar, maximiza uma janela e dá play no programa. A cena é a mesma que está sendo vista por dezenas de pessoas, blogueiros, formadores de opinião, empresários, políticos e escritores de contos eróticos desocupados. Nico fica branco quando na tela surge ele dando a bunda para um coroa e uma mulher assistindo tudo. Lélio está transtornado, anda em círculos pela sala com uma mão na cabeça e a outra abanando no ar. “Você me disse que tinha parado de fazer programa...”. “Eu parei... Isso aí foi antes...”. “Mentira. Mentira. Está vendo essa corrente que você aparece usando no vídeo? É a mesma que você está usando agora e que é a corrente de prata de oitocentos reais que eu ainda tenho nove parcelas para pagar, te dei mês passado...”. Nico não diz nada. Fica em silêncio. Parece mais envergonhado do que ciente da gravidade da situação. “Cara. E essa de você dar a bunda, para mim é novidade...”. “Eu, eu... Eu estava precisando de grana, foi a primeira e única vez. Ele ofereceu uma grana preta para me comer e o pinto dele é bem pequeno...”. Pinto pequeno, como se isso justificasse o fato de dar a bunda sem comprometer a virilidade. “Você sabe quem é esse coroa?”. Nico faz um sinal com a cabeça que tanto poder ser sim como não. “Ah! É um figurão cheio da grana, aí.” “Ah! Esse figurão cheio da grana aí, é um empresário e político poderoso que a essa altura deve estar enfartando e querendo matar quem deixou vazar esse vídeo...”. O rapaz parece ter caído em si e tomado consciência da gravidade da situação. “Você sabia que estava sendo filmado?”. “Não”. “Faz idéia de quem pode ter dado uma copia do filme ao Jean?”. “Ao Jean?”. “Sim. Ao Jean. Foi ele que colocou essa merda na internet e distribuiu para todo mundo...”. “Filha da puta. Vou matar a bichinha”. “Vai nada. Cala a boca que você está metido numa baita encrenca. Precisamos achar um jeito de te por fora de circulação urgente...”. Lélio continua andando de um lado para outro. Abre uma gaveta e tira um envelope. “Toma. Aqui dentro tem toda a grana que eu tenho. Não é grande coisa, mas dá para você comprar uma passagem para longe e se bancar por uns dias. Some, desaparece por um bom tempo. Quando as coisas melhorarem para o seu lado você volta. Mas some ainda hoje, agora. Esse coroa pode mandar te apagar...”.

A campainha da porta do apartamento toca. Ninguém interfonou avisando que estava subindo. Deve ser algum vizinho do prédio... Jean abre à porta imaginando que seja a vizinha, dona Cacilda que sempre aparece sem avisar trazendo um pedaço de torta para ter oportunidade de comentar as suas críticas que lê no jornal. Diz ser sua fã. “Você?”. Jean não tem tempo para dizer mais nada, leva um murro no meio da cara e cai para trás. Bate a cabeça na mesinha de centro e antes que tenha tempo de recobrar-se sente mãos fortes envolverem seu pescoço. O corpo grande e forte senta-se sobre seu peito. As coxas musculosas imobilizam seus braços. O ar falta aos pulmões. Sente que está morrendo, o pânico da morte estampa-se em sua face. Sem ao menos conseguir se debater ou emitir algum som Jean agoniza e o roxo do forro dos caixões de defunto pobre toma seu rosto. Morreu...